eu tenho mil erupções dentro do peito, e nunca pensei em dar esse nome à isso.
o fogo que me sai de vez em quando é sempre acionado pelas borboletas no estômago.
e nesse processo contínuo, a larva, quando endurece e petrifica por um tempo,
tem a ver com o sal de fruta fervendo num copo d'água do Tom Zé.
tem a ver com o sal de fruta fervendo num copo d'água do Tom Zé.
porque por mais rocha que o peito esteja,
ele esquenta de novo e tudo começar a amolecer mais uma vez,
tal e qual um Eno guaraná.
ele esquenta de novo e tudo começar a amolecer mais uma vez,
tal e qual um Eno guaraná.
mas isso não faz do meu corpo, que é ninho, um líquido, um gelo mole.
o ninho de nós - de linha mesmo - que existe dentro do corpo,
é o que nos borda os retalhos das reminiscências.
o ninho de nós - de linha mesmo - que existe dentro do corpo,
é o que nos borda os retalhos das reminiscências.
não cai bem criar um lugar pras lamúrias.
por isso até os nós - de linhas, de novo - precisam do nexo das pedras.
e não há calúnia alguma em dizer que endurecemos.
precisamos ser vulcânicos mesmo, pra ressucitar eventualmente,
de tempos em tempos.
esquentar e esfriar, morrer e nascer, acordar e dormir, como a gente faz.
a gente dorme pra paixão às vezes mesmo, que nem o Ojos del Salado dormindo lá nos Andes.
de tempos em tempos.
esquentar e esfriar, morrer e nascer, acordar e dormir, como a gente faz.
a gente dorme pra paixão às vezes mesmo, que nem o Ojos del Salado dormindo lá nos Andes.
sobre a maré,
não tenho nenhuma filosofia barata não,
não tenho nenhuma construção paradoxal e comparativa pra fazer não.
não tenho nenhuma construção paradoxal e comparativa pra fazer não.
só me gusta pensar em maré mesmo, sem pretenção.
e a maré é ela mesma, sem delírios, sem música, sem filtro.
maré é nome próprio de si mesmo, dando voltas na terra, vagando na minha cama.
"o meu coração é de pedra
dura. cinzenta, vulcânica.
o meu coração é de pedra.
pedra. simples pedra, cinzenta,
dura vulcânica, atlântica.
não sei o que fazer com a pedra.
com o coração, com o vulcão, com o atlântico.
pergunto-me até onde ir. haverá razão
para além do coração, cinzento, vulcânico,
para o retransformar em espuma, líquida,
branca, no meu coração de pedra, atlântica,
vulcânica?
a simples condição, sanguínea, branca,
semântica. como a palavra. o verso, o sentir vulcânico
atlântico."
José António Gonçalves - A pedra, Coração Vulcânico